Cão e a primeira gravidez – O que fazer?
O que fazer com o cão quando a dona fica grávida pela primeira vez?
A situação é, geralmente, estressante para a futura mãe. Mas, na realidade, pode ser o prenúncio de muita diversão e felicidade para toda a família. Basta administrá-la com lógica, sem preconceitos, e adotar atitudes baseadas não no ponto de vista humano, mas sim no ponto de vista do cão.
Ficar com o cão
Induza o cão a cheirar sua barriga: os ouvidos sensíveis dele perceberão que algo está vivo dentro de você
Ao se tornar grávida, não ceda às primeiras sugestões de doar o seu cão. Muito menos o isole. Dirão que cachorro e bebê não dão certo, que é perigoso, que o cão transmite doenças. Quanta falta de informação! Quem chega da rua e não vala as mãos e o rosto é um vetor (condutor) de infecções e moléstias pior que qualquer animal doméstico.
Nos períodos pré-natal, neonatal e pós-natal, que são distintos para o cão, não mude a rotina dele. (lembre-se: ele era o “bebê” da casa quando chegou – era ou não era?).
Faça a chegada do novo membro da família e a presença dele serem vantajosas para o cão e o interesse dele. Para tanto, é importante sempre “raciocinar” como cão. Ele é sensível, seja filhote, seja adulto ou velhinho. Dependendo da idade dele, aja de forma ligeiramente diferente. Permito-me a construir um “teatrinho”, que chamarei de “Os três monólogos de cães”. Um filhote diria, entre pulinhos (principalmente nas pernas da dona): “Oba! Vou ter companhia pra brincar. Isso aí é coisa boa! Vim dar uma cheiradinha na roupa dele e já ganhei um biscoito extra”. O adulto “diria”: Bem… Temos movimento diferente aqui. Mas pelo jeito dos meus donos, deve ser coisa boa. Vamos esperar e ver o que é”. E o velhinho, num “resmungo”, meio incomodado (próprio de velhinhos…): “Sei lá o que “ta” acontecendo. Se vier mexer comigo dou uns resmungos, uns rosnados… Acho que até uns latidinhos e mordidinhas… Mas, não, não acho que meus donos me conhecem bem… Ninguém vai se meter muito comigo”.
Quando conseguimos entender essas atitudes, entendemos o cão dentro das “regras” dele. Um pouco como os humanos: “Se me tratarem bem, tudo ok…”. Regra de jogo do behaviorismo mais simples.
Preparativos
Não esconda o bebê: controle o contato entre os dois
É muito importante que o cão seja levado para uma verificação do estado geral de saúde dele. As poucas afecções que seriam transmissíveis são facilmente percebidas pelo veterinário e tratáveis, deixando o cão em perfeitas condições de convívio com os da casa e, em especial, com o bebê, cuja imunidade neonatal é incipiente.
Quanto à obediência, a quem o cão “ouve” melhor? Se não for a um dos donos, um adestrador que conheça condicionamento operante e que saiba usar o “clicker” poderá ajudar o cão a reconhecer quem são os “alfas” da casa.
Não se iluda. Seu cachorro sabe muito bem, intuitivamente, que tem gente nova chegando. Ele deve ser familiarizado com os novos sons, odores, e visões que terá com a vinda do bebê, nas semanas que antecedem a chegada. Isso inclui tudo que estará associado ao mais novo integrante da família: mobiliário, ambientes, roupas, loções e cremes.
O espaço “quarto de bebê” deve ser aberto ao cão, com supervisão e regras relativas a quando ele pode entrar. Não é aconselhável que o quarto se torne uma área proibida. Aos que alegarem alergias, diga que estudos internacionais já mostraram que, quanto mais cedo for o contato da criança com animais, menor a probabilidade de ela desenvolver problemas respiratórios. A menos que o bebê nasça alérgico e seja diagnosticado como tal.
É bom fingir trocar fraldas numa boneca na presença do seu cão, para ele se acostumar. Isso é importante. Dependendo do apego que o cão vier a desenvolver com o bebê, vai “defendê-lo” de qualquer perigo, pois a natureza ensinou a ele que o bebê “filhote” humano é a parte mais fraca do conjunto.
Induza seu cão a cheirar as futuras roupinhas do bebê. Se ele não se encostar nelas, prêmio para ele e palavras de carinho e aprovação.
Leve o cão a casas que tenham bebês, para que ele sinta o cheiro de crianças, aquele odor especial de bebê. Ele também se familiarizará com diferentes choros – de fome, de dor de barriga, de sono e até, simplesmente de manha.
Peça roupinhas dos filhos dos seus amigos antes de serem lavadas, para o cão cheirar. Isso inclui a roupinha de cama. O suor de um bebê recém-nascido tem odor característico. Lembre-se que os cães são farejadores naturais e que, quando procuram identificar logo pelo cheiro, são capazes de distinguir centenas de nuances, enquanto os humanos detectariam umas quatro ou cinco.
Educar os dois: o cão pode ser à prova de crianças e a criança para ser à prova de cães
Faça também o seu bebê, enquanto estiver ainda sendo gestado, ouvir os latidos do cão. Quando ele latir como normalmente faz, fique perto dele. Se os latidos forem exagerados, fora dos padrões usuais, diga-lhe um “não” firme, mas sem gritar, para não assustar o bebê.
Sempre que tiver um tempinho, chame o cão, sente num sofá, acaricie-o e induza-o a cheirar sua barriga. Os ouvidos exatamente sensíveis dele vão perceber, que dentro de você, algo está vivo.
Faça um grande esforço para não mudar a rotina do cão. Se agora não dá para continuar a levar o cachorro para passear, consiga outra pessoa para levá-lo, mas não deixe que ele pare de andar. Peça a amigos que venham visitá-lo, para que ele se sinta, ainda, o centro de atenção. Não esqueça de acariciar o cão sempre que possível. Reafirme que você gosta dele.
Com o bebê
Um destaque especial: as fraldas sujas! Filhotes e cães adultos consideram as fezes de recém-nascido o caviar canino. Se encontrarem “caviar” disponível, eles o comem. A isso se chama coprofagia, que pode se tornar crônica. Seu cão não deve chegar muito perto das fraldas, mas deve saber o que é feito com elas. Guarde-as em recipiente de lixo à prova de cão “investigativo”, principalmente se o cão for filhote. Um bebê com diarréia provocada por salmonela, por exemplo (um dos poucos males vindos de humanos que podem afetar os cães), ainda que pouco provável, pode contaminar o cão, seja filhote ou adulto.
Não esconda o bebê do cão. Controle o contato entre eles. Nunca deixe uma criança sozinha com o mais manso dos cães, até ela ter pelo menos oito anos. O cão é irracional. Não tem noção de ética, não sabe diferenciar o bem do mal, e sim o perigoso do seguro. Não ser racional não significa não ter “sentimentos”. Ele é leal. Ama você e sua família (a “matilha” dele) incondicionalmente. Pode ser capaz dos maiores atos de verdadeiro heroísmo, praticados na defesa de seus donos. Mas, em determinadas circunstâncias, geralmente por medo, por dor ou por sentir-se acuado, o cão morde o próprio dono ou quem que quer esteja representando perigo ou dor. Se o cão não for educado e se tiver tendência possessiva, pode atacar quem se aproximar da comida dele, por exemplo. Há exercícios próprios para educá-lo nesse particular. Preste bem atenção nisso, pois quando menos você esperar, seu filho estará comendo a ração do cão e esse último, o biscoito do intrépido infante. É possível educar um cão para ser a prova de crianças e a criança para ser a prova de cães.
Por: Sergio P. Mendes.
Sérgio P. Mendes é instrutor e adestrador de cães, membro da Association of Pet Dog Trainers (APDT), especializado em terapia assistida por cães. Tel.: (11) 3052-2527
Fonte: Revista Cão & Cia
